Conto – O julgamento de Kullat (por G.Norris)

Julgamentos de Senhores de Castelo não exatamente inéditos. Todos os Senhores de Castelo em atividade pelo menos uma vez na vida já tiveram a experiência de pisar no tribunal circular feito de mármore branco, na maior torre da 1ª torre de Ev`ve, e lá defenderem suas ações e atitudes diante dos anciões.

O tribunal do Conselho é composto por três anciões, que ouvem e interrogam os Senhores de Castelo em uma tribuna circular. Todos usam capuzes brancos com tons dourados. O réu fica no piso de baixo, com apenas um aparato tecno-magico que inibe seus poderes, não possuindo advogados ou representantes, fazendo sua própria defesa. Jamais este sistema deixou de punir os que realmente mereciam punição e absolver os que realmente tinham absolvição.

Kulalt entrou calmamente pela pequena porta oval que leva ao centro do tribunal. Carregava no pulso o dispositivo que anulava seus poderes, assim, suas mãos enfaixadas não emitiam qualquer brilho, bem como seu manto não tinha a habitual aparência espectral. Do seu lado esquerdo, estavam vários Senhores de Castelo, todos sentados na chamada “Ala Testemunhal”. À direita, a “Ala Observal”, composta de Senhores de Castelo e também de aprendizes. Olhando para a ala das testemunhas sorriu ao ver Thagir. Seus olhos se encontraram e ambos fizeram um pequeno aceno com a cabeça.

– Todos de pé – disse uma voz grossa.Ao ver os juízes e o cristal a sua frente, Kullat sabia que seria julgado por suas emoções, seus poderes e sua decisão. Todos se sentaram, então uma voz ecoou no enorme salão.

Todos se levantaram. Três figuras surgiram de uma porta ao fundo. Enquanto se dirigiam ao púlpito, nenhuma palavra foi proferida. Kullat reconheceu pelo resplendor da pele metálica Parallel, Senhor de Castelo do reino tecnológico de D-Bi01. Um andróide que aprendeu magia e feitiços. Usa um manto branco similar ao de Kullat e apresenta uma lógica emocional muito avançada. Atrás de Parallel, entrou Kim-moross, vinda do extinto mundo Miaron. De pele vermelha e cabelos longos de cor violeta, seus olhos são negros sem íris. Armeira-mor de Ev’ve, é letal com armas de fogo. O último juiz era Pisamehe, pertencente a uma raça de seres etéreos do reino de Ututau, se apresenta como um cristal de luz branca consciente, embora possa surgir como uma mulher jovem de cabelos feitos de luz. Possui grande influencia no conselho. Considerada grandiosa por sua visão política e estratégica.

– Começa agora o julgamento de Kullat, Senhor de Castelo de Oririn, do 1º quadrante dos mares do destino. Goperati é estrategicamente importante para Agas’B por ser o centro da indústria bélica e mineral e da transformação de matéria prima.O relacionamento do regente com o Conselho dos Senhores de Castelo é limitado e bem restrito. Os Senhores de RC’s não respeitam Tavar como líder e não o consideram como superior hierárquico supremo do reino. Tavar também não morre de amores pelo Conselho, visto que tenta, sem sucesso, impor sua condição de soberano há anos. As relações entre os dois grupos é tênue e fraca.Os guardas os acompanhavam em silencio e os deixaram parados perto da porta.

Kullat e Thagir entraram no Palacio Avenyr pelo portão central. Disseram seus nomes aos guardas vestidos de negro e cinza e foram escoltados até as grandes escadas, subindo até o quinto andar, entrando pro uma enorme porta de vidro e se dirigindo a sala central.

Há uma troca constante de regentes no reino, muito por questões políticas e também por desavenças culturais entre os próprios governantes. Há quatro anos, o regente atual é Tavar Mares, um homem de estatura baixa e poucos cabeços. Teimoso e arrogante, procura ser sempre o centro das atenções, promovendo eventos e apresentações para públicos da alta elite de Agas’B. Tavar é um político inteligente e poderoso, além de controverso. Não teve escrúpulos em rebaixar dois governadores já experientes para o posto de conselheiros e por em seus lugares pessoas mais jovens. Também perdeu prestigio com seus comandados quando não puniu devidamente Epil-Niod, Governador de Opecib, por insubordinação e tortura. Seu governador e conselheiro financeiro também é um jovem, o que causa desconforto em várias esferas da política goperatiana.

O reino de Goperati fica ao sul de Agas’B, sendo parte integrante do império rubro branco de Agas’B. Dividido em 11 grandes feudos, cada qual com seu próprio governador.

E, de fato, começara o julgamento.

– Me lembre novamente porque estamos aqui – disse Kullat ao amigo pistoleiro.

– Problemas nas minas de Cenes, Kullat. O conselho recebeu várias reclamações sobre Tavar e Niod – respondeu Thagir com um ar cansado. Não era a primeira vez que vinham negociar com Tavar.

– Só checando – respondeu o encapuzado abrindo a porta a sua frente.Do lado esquerdo, Edvie’Bill. Considerado pro muitos o próximo a assumir a regência de Goperati. De pele escura e altura mediana, é governador de Planmto, responsável por toda a estratégia militar e social do regente. Abaixo dele, estão Maaldo – antigo governador, agora rebaixado a conselheiro de Monit – e Lo’erme – conselheiro de Strat.

Sem mostrar qualquer reação a presença dos Senhores de Castelo, Ezino Betta lia um pergaminho azul. Um dos mais antigos governadores de Goperati, Betta esteve presente desde a invasão do reino por Agas’b, tornando-se governador pela oportunidade surgida durante a guerra. Respeitado e temido por muitos, responsável por todas as milícias de Goperati. Seu feudo é chamado de Piefes.

A visão era a mesma de sempre. Uma mesa oval enorme, feita de mármore branco, era o centro da sala de paredes vermelhas e brancas. A bandeira de Agas`B enrolada ao fundo, como se nada representasse aos homens sentados ali. Tavar, sentado como um rei na ponta contrária da mesa, levantou os olhos para a porta que se abria. Para desgosto de Thagir, assim que teve visão total da sala, percebeu que todos eles estavam presentes. Do lado direito da mesa estava Ruvogt, loiro de cabelos ralos e estatura alta. Governador de Censer. Responsável pela extração e produção maciça de várias matérias primas. Experiente e metódico, é tratado com cautela pelos demais. Ao seu lado, estava Rubord, o Governador de Cenes. Narcisista e egocêntrico, é um homem baixo, musculoso e de cabelos negros enrolados. Ansioso, sempre procura atender Tavar com rapidez, porém, é inseguro quanto ao regente. Não tem escrúpulos para atingir seus objetivos pessoais, usa pessoas e recursos em prol de seu próprio benefício e depois as descarta sem preocupações. Um pouco afastado dos dois primeiros, sentado com um sorriso maroto no rosto, Biogam tomava um cálice de vinho. Também chamado de “Raivoso” pelas castas baixas do reino, é jovem e impetuoso, foi nomeado governador faz pouco tempo, causando choque político entre as castas. Possui grande estima junto ao atual regente. É chefe de Onel Osodrac – antigo governador, agora rebaixado a conselheiro de Assur. Ainda do lado direito da mesa, estavam Ajun, outro jovem que o regente colocou na alta cúpula do reino. Responsável pelas extrações de ouro e pedras preciosas das minas de Goperati, é governador de Finan e conselheiro-mor do tesouro real e Pprak, governador de Eciffo Daeh, após a queda de Niz’Fran.

– Vejam quem chegou – disse uma voz rouca cheia de sarcasmo.Para completar a mesa, Aiobas. Vindo dos mares do destino, este estrangeiro subiu rapidamente pela hierarquia do reino com promessas de milagres na produção, principalmente na de matéria prima. Vaidoso e muito inteligente, conseguiu chegar a governador em pouco tempo, sempre culpando outros pelos fracassos e vendendo como seus os sucessos. É governador de Remusnoc.

Os diretos de Tavar, pensou Kullat. Homens de grande poder que utilizam os recursos naturais das áreas e que governam com mão de ferro.

Thagir não precisou olhar para o homem sentado ao lado de Tavar para saber quem dalava com tanta arrogância. Epil-Niod. O “Louco do Inferno”. Considerado por todos no reino como uma ameaça constante a paz e a soberania do reino. Teimoso e com delírios de grandeza, sempre está a gritar e humilhar seus subordinados. Sempre causou problemas por onde passou, com constantes brigas e desentendimentos entre seus comparsas e até seus colegas governadores. A última de suas brigas resultou em sua quase execução, porém, o regente interveio a seu favor, deixando-o livre. Governador de Opecib, é considerado pelo regente um grande líder, porém, ninguém mais compartilha dessa visão. Pouco a frente de Niod, Zelaz Gon resmungou algo, mas ninguém deu atenção. Baixo e barrigudo, o governador de Soruges é um homem do campo, voltado para a pecuária e agricultura. Suas atividades incluem as garantias de vida dos subordinados e a proteção de suas casas. Também é responsável pelos meios de transporte do reino e suas frotas.

– Senhores – a voz de Tavar era fina e um pouco aguda. O modo como puxava o lábio inferior para a esquerda era um tanto cômica – Estávamos esperando por vocês. Por favor, sentem-se.

Havia duas cadeiras vazias a mesa. Os Senhores de Castelo se olharam. Era o que bastava para concordarem mutuamente com a idéia. Sabiam que seria uma tarde horrível.

 

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